segunda-feira, julho 18, 2005

A Morte antes da Morte

Aquela garotinha feliz, que nasceu numa cidadezinha do interior de São Paulo, neta de italianos, com uma gangue de irmãos é, agora, essa senhora deitada nesta cama, com o olhar perdido, sem conciencia do seu próprio estado.
Compará-la com um vegetal não é nem um pouco errado. Essa senhora não tem conciencia de si mesmo e pior: não se movimenta, não come, não fala. É um vegetal a espera da morte. Morte essa que não chega. Faz mais de dois anos que se encontra nesse estado e nada dela libertar-se desse sofrimento.
Afinal, ela vive na morte. Ela é a personificação da morte. Ela não morreu, mas em todos os nossos corações e na vida prática, ela está morta.
Fisicamente, ainda vive, seu corpo ainda faz metabolismo. Mas em todos os outros sentidos, ela está morta. É isso que ganhamos com a ciência, que vive atrás do "elixir da vida"? Ganhamos uma imortabilidade como vegetais? Será que em um caso desses não é melhor deixá-la morrer, já que não há a menor esperança dela voltar a seu estado normal?
Para que fazer sofrer uma alma que já viveu uma vida inteira? Para que prolongar a vida de quem não tem mais vida?
Tantas vezes a visitei nesse estado. Tantas vezes tive a impressão de a ver em seus últimos momentos. Tantas vezes chorei a sua perda. E, agora, finalmente percebo aquilo que era óbvio e estava diante de mim o tempo todo.
Ela já havia morrido há muito tempo. Ela não existia mais psicológicamente. Apenas fisicamente, mas isso não é vida. Ela havia morrido mas vivia. Vivia sem esperanças, sem saber que vivia. Sem saber que não sabia.
Ela nada sabia. Ela vivia morta. Quando, finalmente, seu corpo não mais funcionar o suficiente para seu coração bater, vou chorar. Meu choro será de alívio, de tristeza pelas lembranças, de saudades, porém não será de dor por um ente querido: esse choro eu já chorei faz tempo.

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