Aquela garotinha feliz, que nasceu numa cidadezinha do interior de São Paulo, neta de italianos, com uma gangue de irmãos é, agora, essa senhora deitada nesta cama, com o olhar perdido, sem conciencia do seu próprio estado.
Compará-la com um vegetal não é nem um pouco errado. Essa senhora não tem conciencia de si mesmo e pior: não se movimenta, não come, não fala. É um vegetal a espera da morte. Morte essa que não chega. Faz mais de dois anos que se encontra nesse estado e nada dela libertar-se desse sofrimento.
Afinal, ela vive na morte. Ela é a personificação da morte. Ela não morreu, mas em todos os nossos corações e na vida prática, ela está morta.
Fisicamente, ainda vive, seu corpo ainda faz metabolismo. Mas em todos os outros sentidos, ela está morta. É isso que ganhamos com a ciência, que vive atrás do "elixir da vida"? Ganhamos uma imortabilidade como vegetais? Será que em um caso desses não é melhor deixá-la morrer, já que não há a menor esperança dela voltar a seu estado normal?
Para que fazer sofrer uma alma que já viveu uma vida inteira? Para que prolongar a vida de quem não tem mais vida?
Tantas vezes a visitei nesse estado. Tantas vezes tive a impressão de a ver em seus últimos momentos. Tantas vezes chorei a sua perda. E, agora, finalmente percebo aquilo que era óbvio e estava diante de mim o tempo todo.
Ela já havia morrido há muito tempo. Ela não existia mais psicológicamente. Apenas fisicamente, mas isso não é vida. Ela havia morrido mas vivia. Vivia sem esperanças, sem saber que vivia. Sem saber que não sabia.
Ela nada sabia. Ela vivia morta. Quando, finalmente, seu corpo não mais funcionar o suficiente para seu coração bater, vou chorar. Meu choro será de alívio, de tristeza pelas lembranças, de saudades, porém não será de dor por um ente querido: esse choro eu já chorei faz tempo.
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